Acredito que nós, como indivíduos de uma sociedade, só temos a perder com esse interlúdio que é a polarização. Penso que esse fato não seja segredo para ninguém, porém, venho aqui defender a importância da troca e conversação entre as pessoas para o desenvolvimento crítico-social.
É evidente que nós, enquanto indivíduos, tenhamos nossas particularidades, nos diferenciamos um dos outros de alguma forma, talvez na profissão, gosto musical ou religião. Porém construímos também uma personalidade como grupo, seja um grupo de sala de aula ou mesmo uma cidade ou país. Neste grupo, por meio das relações interpessoais, os indivíduos reorganizam qualitativamente suas funções psicológicas, que são organizadas e ressignificadas conforme o contexto sociocultural; ou seja, aprendemos e nos desenvolvemos culturalmente e socialmente, também, através da troca bilateral.
Segundo o psicólogo Lev Semionovitch Vigotski, o ser humano nasce com uma estrutura genética e um aparato neuroanatômico que sozinhos, não são condições suficientes para o indivíduo adquirir sua “condição humana”; ele precisará de condições culturais e sociais. Os grupos sociais e seus membros exercem a mediação entre a cultura e o indivíduo, promovendo o desenvolvimento de processos interpsicológicos. A categorização da polarização limita o debate a um ponto em que não há essa troca, já que os poucos diálogos são acusações jogadas ao ar sem fundamento. Está semana tivemos o caso de um vídeo postando pela primeira-dama - sendo este apenas um dos muitos exemplos recentes-, do qual se criou uma acusação que, a meu ver, bastava alguns segundos de reflexão para compreender que aquele ataque não fazia sentido, que era meramente uma cortina de fumaça para que os cães ladrem enquanto se faz outras coisas piores por debaixo dos panos. Ou seja, além de não haver troca na polarização, também são debatidos argumentos que não nos levam a nenhum tipo de desenvolvimento intelectual ou social.
Mas a questão é que por causa da polarização não acontece a troca de ideias para o refinamento de uma cultura, pois o que acontece é um debate artificial, criado para justamente não se criar uma intersubjetividade, nutrido para não emergir um desenvolvimento psicológico e cognitivo. Porque, em uma sociedade separada, se fabrica heróis com mais facilidade, se conduz a opinião pública com mais êxito.
A polarização cria grupos radicais, animalescos que atentam contra a vida, nutre guerras e perseguições raciais tem fundo, também, nessa divisão artificial. A polarização gera dinheiro, e fica fácil enxergar isso no ex-Twitter, onde se é compartilhado os maiores absurdos para ganhar engajamento e likes - o que, obviamente, também acontece em outras redes sociais. Além do impulsionamento político e ideológico que a polarização recebe, também existe incentivo financeiro e mercadológico por trás dela.
Um dia nos veremos livres da polarização e apegados ao amparo do outro. Enquanto isso não acontece, seguimos estudando, buscando conhecimento, não nos privando da troca para evoluirmos como sociedade e indivíduos.
Além do Eu
Luiz Gustavo Pereira é compositor e escritor com dezenas de trabalhos lançados por bandas e sua produtora. É acadêmico de Psicologia e foi um dos fundadores da Liga Acadêmica de Saúde e Espiritualidade (Lasesp) e é membro da Liga Acadêmica de Psicanálise (Lepsic).
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